domingo, 25 de julho de 2010

Quatros festivais internacionais

Ontem, ao fim de quase duas semanas retido em casa, tomei a decisão de dar uma volta por Montreal pois só festivais a nível internacional, havia quatro. Montreal é uma bonita cidade, ruas paralelas, plena de jardins e de árvores mas tem certos problemas como tudo o que é grande. Dentro dos seus problemas encontra-se a busca de postos de trabalho para todos.
Assim, procura a cãmara desenvolver um grande número de eventos no verão e sempre que possível no inverno, acontecendo o mesmo em todo o Quebec. Traz muito turismo de todas as qualidades e alguns ficam de um evento para outro. Usufruindo os governos municipais de uma certa autonomia, podendo lançar certos impostos, indo buscar dinheiros ao Federal e Provincial de formas estipuladas com parâmetros muito bem definidos, permite-lhes exigir o que têm direito. Assim, os governos municipais lutam ao máximo por obterem fundos e postos de trabalho, com a finalidade de cobrirem as necessidades das suas terras e gentes.
Tendo passado a época de ouro da revolução industrial há muitos anos, conseguiram durante muito tempo manter fábricas necessitando de mão de obra intensiva, só que esse tempo passou há mais de uma década. Por sua vez o Quebec inteiro virou-se para a educação mas rápidamente se começou a ver pessoas com os mais variados cursos superiores a aceitarem os mais diversos trabalhos. Ver-se hoje um(a) diplomado(a) a trabalhar numa caixa de supermercado é banal, não falando dos seus imigrantes aonde ver-se um médico como motorista de táxi ou um advogado a trabalhar nas limpezas como aconteceu com um português e que hoje está bem na sua terra, não é caso raro. As pessoas para viverem, se não fôr exatamente o emprego que desejam, não dão as suas habilitações todas. A mentalidade destes lados é que uma pessoa sem trabalhar se não procura emprego ou não aceita o que lhe aparece, nem que seja até que encontre outro, não é digno da sociedade. Há-os mas esses vivem à parte da sociedade e muito mal vistos por ela. Qualquer que seja o trabalho, é digno e a pessoa logo que tenha uma chance, que o largue e siga a sua vida. É assim a vida. Entre outros casos, houve um actor, realizador e senarista, que ganhou o Festival Internacional de Cannes fora outros e que pelo meio dos festivais, enquanto não arranjava fundos para novos filmes foi fazendo taxi, como aqui se diz, limpezas e quando faleceu fazia videos de propaganda comercial, o que finalmente lhe deu dinheiro. Neste momento o ajudante de concierge* numa casa de terceiro andar, nada de especial, é um engenheiro em conceção mecânica. Numa grande empresa a nível internacional que não nomearei por motivos óbvios, tem neste momento um Doutor** universitário inglês a trabalhar como desenhador. Isto faz com que as pessoas se contactem de forma muito aberta, direta e em número muito elevado sem se conhecerem, se bem que no trabalho a luta seja feroz. É isto uma das mentalidades generalizadas por estes lados e que poucos que para cá vêm, falam.

Como por vezes o que se escreve não é o espelho real do que se vê, tomei a decisão de sempre que possível quando publico um artigo, fazê-lo com fotografias. Se disser que já vi pessoas a voarem como verão mais abaixo, é mesmo melhor acompanhar de uma fotografia. Assim, ontem, nos diferentes festivais, fiz trezentas e oitenta fotografias das quais apresentarei só algumas neste e nos próximos artigos.

Comecei por me deslocar primeiramente a um festival que alertou a minha curiosidade pois tratou-se de corridas de barcos "Dragão". Mesmo que não soubesse que se tratava de corridas de origem chinesa, ao chegar e ao ver um altar budista com budas a fazerem uma prece matinal, teria descoberto.
Foi pena que já não cheguei a tempo de os fotografar nas suas preces mas o altar ficou.

Quando ao tipo de corridas com embarcações com o nome de Dragão, saltou-me logo ao pensamento barcos muito coloridos com o seu grande dragão, com os seus remadores(as) num esforço bem visível pelos contornos dos músculos, as pernas nos seu movimentos sincronizados com os braços e o corpo, o movimento das suas cabeças, tudo isto ao som do batimento do timoneiro. As mãos crispadas nas pagaias, os traços do esforço e das dôres marcados nas caras, os lábios serrados contra os dentes como se os músculos estivessem a empurrar os dentes da frente para dentro, com uma determinação de dar tudo o que têm dentro do corpo e da alma mas aonde por vezes menos de um segundo determina o campeão. Tudo isto, diante da alegria ou tristeza da pessoa que vai ao leme em águas calmas, que suou para manter o barco na pista com as suas ordens à base de gritos constantes, fortes e curtos.
Com esta visão, fui até à bacia olímpica na ilha de Santa Helena, uma das várias ilhas que envolvem Montreal, e aonde tem lugar anualmente a F1. Vi muitos coloridos nos barcos com umas cabeças de dragões pequeninas e repectivas caudas, aonde certos barcos com desenhos laterais octogonais a lembrar os corpos dos dragões, os faziam sobressair da água como os chineses nos habituaram. Os barcos eram longos, estreitos mas sem a elegância dos "charutos", as tripulações eram oriundas dos vários lados do nosso planeta como a Inglaterra, França, Japão, China, EU, etc, e muito naturalmente do Canada e do Quebec. O ambiente que as próprias tripulações ajudaram a criar, deleitou-me. Por todos os lados se viam as tendas das equipas competidoras com as suas côres assim como nas roupas dos competidores. "Verdadeiros" paddocks da F1, aonde neste caso podíamos passear livremente.




O distender dos músculos no local antes de partir, dependendo da equipa, era divertido de se ver.





Além de equipas como as dos países já referidos, o que me surpreendeu foi ver equipas de terceira idade a competirem com os novatos. Praticam este desporto como manutenção física. Trata-se de uma modalidade que obriga a treino durante todo o ano e no Quebec é muito difícil de praticar de inverno, pois nessa época os treinos têm lugar em locais próprios e muitas vezes a sêco, o que obriga a muito querer, determinação e coragem. Algumas pessoas de idade respeitosa mostrando um bem estar e alegria estonteantes, uma ou outra ajudada a entrar no barco mas depois de assentadas... aqueles barcos andaram. Admirável. Se os adversário receberam grandes ovações, a terceira idade foi sempre a mais aplaudida.

Equipa da terceira idade pronta a sair para o local de partida.

Outra equipa da terceira idade a acabar de cortar a meta.


Falei com o atleta abaixo, vindo de Vermont-EU, uma boa meia hora. A um certo momento disse-me que no barco da sua equipa que ia partir nesse momento numa modalidade que não era a dele, ia uma senhora de oitenta anos. Não haja dúvida, ele ao pé dela é um novato pois só tem setenta e oito anos!

No fim das provas da manhã, fui até à bancada central assistir a um espetáculo que ia começar. A um dado momento do espetáculo, comecei a ver que várias embarcações se reuniam por trás do palco no meio do rio.

Neste momento, o conjunto ainda não devia ter-se apercebido do que se passava atrás.

Começaram a aproximar-se lentamente e num momento exato, todos levantaram as pagaias com um cravo côr de rosa nas mãos: sinal da luta contra o cancro. Foi o silêncio total com esta surpresa, o espetáculo parou. O barco da direita afastou-se dos outros, aproximou-se da costa, saíu uma terceira idade com um cravo na mão e foi entregá-lo a uma pessoa em cadeira de rodas. Silêncio total novamente, seguido de uma grande salva de palmas. Foram uns segundos muito profundos. É isto que noto por estas bandas, as pessoas guerreiam-se mas estão sempre perto dos outros. Dentro da forma de ver destas gentes, não se deve dar sem se fazer qualquer coisa que represente um esforço próprio. Assim a terceira idade correu para angariar fundos para a luta contra o cancro. Momentos inesquecíveis. De tal maneira fiquei, que até nem me lembrei de fotografar a entrega da rosa. Muita alegria, mas aqueles(as) terceiras idades estavam a pensar em quem sofre.

Depois fui até à zona dos comes, aonde não faltava comida chinesa ajudada a degirir com a actuação de mais um conjunto musical.

Aproveitei para ver distrações que me despertaram mais a atenção e das quais algumas se podem ver a seguir.

Em frente da estação CTV, Canadian Televison, que também estava presente, voltei muitos anos atrás. Até parecia que estava a ver uma miúda muito pequenina, que vivia ao fundo de uma rua perpendicular à minha, no bairro aonde eu vivia, rua A e que com um arco destes, muito mais alto do que ela, não parava de o fazer rodar o tempo que queria. Tudo me voltou à cabeça. Fiquei tempos a admirar a juventude de hoje. Muito parecida com a do nosso tempo, em muitas coisas.

Admirando sempre tudo o que diz respeito ao espaço, jamais me poderia passar despercebido pessoas a voarem, sem asas nem paraquedas. Isto não é brincadeira pois foi real, pelo que aqui fica uma fotografia abaixo. Futuramente voltarei a este assunto.

O mesmo farei com um festival que não vi, Heavy MTL, pois só faltou bater com os calcanhares no r... por motivos de "segurança” pessoal. Os excelentes festivais internacionais "Noites de África" e "Juste pour rire", este com o seu sempre agradável desfile de gémeos seguido do baile em que aos "Monsieurs" não era permitido negarem-se a dançar. Todos os espetáculo estiveram sempre super lotados.

Os dragões destes barcos já foram descansar mas a notória "amigável" velha rivalidade, continua.

Nada melhor para uma despedida que verdadeiros "Dragões".



Assim, umas centenas largas de pessoas tiveram trabalho só nas corridas de barcos do "Dragão", quer fôsse diretamente no evento, quer fôsse através de comerciantes que são um excelente motor de criação de empregos. No fim de tudo, é um dos objectivos mais importante.

Próximamente publicarei um slide com algumas fotografias das corridas de barcos "Dragão".

*Concierge – pessoa que faz um pouco de tudo para manter um edifício limpo e funcional. Quer seja limpesas, mudar parte da canalização e torneiras, reparar paredes, etc. Só não pode tocar na parte elétrica, pois se houver algum problema e o sistema eléctrico tiver sido tocado por alguém não credenciado, o seguro não paga. Gosto muito de saber e dar a conhecer estes pequenos nadas, porque nos ajuda a compreender o modo de vida das pessoas de uma região.

** Doutor – Curso completo da universidade ou médico. Neste caso, o primeiro.

2 comentários:

Titá disse...

A parte inicial do teu texto deu-me uma perspectiva completamente diferente daquilo que eu imaginava no que respeita à relação emprego/habilitações. Pensei que por esses lados não existisse esse "problema". Embora o verdadeiro problema seja não haver mesmo postos de trabalho.

AAAqui Ici Here e Alem Mar disse...

Titá,

Sem dúvida que o problema habilitações/emprego deve ser geral em todo o mundo que optou pela democratização do ensino e que no caso do Quebec, não é diferente dos outros lados. Isto levou a um grande número de pessoas com estudos universitários e criou um desiquilíbrio em relação aos trabalhos ditos tradicionais e de apoio. Assim, há lugares abertos a pessoas com cursos profissionais que não precisam mais do que o secundário quinto e até menos, em grande número mesmo muito bem pagos. De longe muito superior que a trabalhar num supermercado ou outros serviços equivalentes. A realidade é que sempre que há um desiquilíbrio aparace uma força com tendência contrária. Parece que se está a inciar. Sejamos positivos.